Do exílio metafísico: existência, escritura e destino em Cioran
Resumen
Formado em Filosofia pela Universidade de Bucareste, em 1932, Emil Cioran (1911-1995) é um pensador e escritor romeno radicado na França, onde, vivendo em Paris, abandonaria seu idioma materno, adotando o francês como língua de expressão. Como outros autores do século XX, ele é um exemplar notável de dois fenômenos tipicamente modernos, amiúde concomitantes: a condição do intelectual enquanto exilado e o bilinguismo, estando sua obra marcada por um corte incisivo, em função do qual ela se divide em uma parte romena e uma contraparte francesa . Pretende-se expor, a partir da dupla problemática do exílio e do câmbio de idioma, a articulação de três temáticas conforme elas são trabalhadas pela escritura filopoética de Cioran: existência, metafísica e destino. A partir delas, pretende-se elucidar a noção de “exílio metafísico” cunhada por Cioran para descrever-se.Formado em Filosofia pela Universidade de Bucareste, em 1932, Emil[1] Cioran (1911-1995) é um pensador e escritor romeno[2] radicado na França, onde, vivendo em Paris, abandonaria seu idioma materno, adotando o francês como língua de expressão. Como outros autores do século XX, ele é um exemplar notável de dois fenômenos tipicamente modernos, amiúde concomitantes: a condição do intelectual enquanto exilado e o bilinguismo, estando sua obra marcada por um corte incisivo, em função do qual ela se divide em uma parte romena e uma contraparte francesa[3]. Pretende-se expor, a partir da dupla problemática do exílio e do câmbio de idioma, a articulação de três temáticas conforme elas são trabalhadas pela escritura filopoética de Cioran: existência, metafísica e destino. A partir delas, pretende-se elucidar a noção de “exílio metafísico” cunhada por Cioran para descrever-se.[1] Muito embora tenha se tornado conhecido, enquanto escritor francês pela assinatura em sigla (a qual não pressupõe um nome duplo, como se costuma supor, por exemplo, “Emil Mihai” ou “Emil Michel”, mas tão-somente a sequência das duas primeiras letras de Emil), seu nome de batismo é simplesmente Emil Cioran. Empregaremos a forma francesa de sua assinatura, a partir do livro de estreia na língua estrangeira, o Breviário de decomposição: E.M. Cioran.
[2]Mais especificamente, transilvano (havendo três grandes regiões que compõem a nação romena, a Transilvânia, a Valáquia e a Moldávia). É importante explicitá-lo, pois este dado é relevante no que concerne ao tema do exílio, permitindo afirmar que, em certo sentido, Cioran nasceu em exílio: até as primeiras décadas do século XX, a Transilvânia pertencia ao Império Austro-húngaro, de modo que, tecnicamente, Cioran é um “filho” do império bicéfalo, sua identidade romena estando determinada por sua ancestralidade dácia-trácia (primeiros povoadores da região na Antiguidade, antes da chegada dos romanos e, posteriormente, do cristianismo), por seu idioma (de raiz latina, sendo o romeno a única língua românica no mundo com certa influência eslávica) e, por fim, pela religião ortodoxa dos seus pais (e da Romênia em geral, cuja população é 80% cristã ortodoxa, aos moldes do cristianismo bizantino, não latino). Seu pai, Emilian, era um padre ortodoxo. Ao mudar-se para Bucareste, aos 17 anos, para estudar Filosofia na principal universidade da capital (situada na região da Valáquia, ao sul do país), Cioran na verdade ingressaria na Romênia pela primeira vez, precisando providenciar documentos de identidade nacional que não possuía, por haver nascido e vivido até então em território austro-húngaro. Após o fim da Segunda Guerra, perde sua cidadania romena, tampouco possuindo cidadania francesa: torna-se apátrida, não dispondo senão de um passaporte Nansen, emitido pela Liga das Nações para que refugiados e apátridas pudessem transitar entre os países europeus.
[3] Cronologicamente, de 1934 a 1944-45 (já vivendo em Paris), começando por Nos cumes do desespero e então O livro das ilusões (ambos publicados no Brasil), seguidos de mais 4 livros no idioma materno; de 1949 a 1987, mais 10 livros escritos em francês, a começar pelo Breviário de decomposição e em seguida Silogismos da amargura, ambos publicados no Brasil, além de História e utopia e Exercícios de admiração).
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Citas
"Não se habita um país, habita-se uma língua. Uma pátria é isso e nada mais." (Cioran)
“Um homem que se respeita não tem pátria. Uma pátria é algo pegajoso.” (Cioran)
"'Se pudéssemos ensinar geografia a um pombo-correio, seu voo inconsciente, direto ao alvo, se tornaria impossível no ato' (Carl-Gustav Carus)
O escritor que muda de língua se encontra na situação pombo sábio e desamparado." (Cioran)
"Só estamos seguros em nosso universo verbal, manobrável a nosso bel-prazer, e ineficaz. O ser é mudo e o espírito tagarela. Isso se chama conhecer." (Cioran)
"A música, sistema de adeuses, evoca uma física cujo ponto de partida não seriam os átomos, mas as lágrimas." (Cioran)
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